O conflito interno da mulher moderna

O conflito interno da mulher moderna

por Letícia Lacerda - mãe, jornalista e escritora do blog "porres literários" 


Neste último carnaval tive alguns dias livres. Não é algo tão comum quando se é mãe e se
trabalha fora. Tomei algumas taças de vinho, não nego; sem marido e sem filho. Consegui
relaxar e pensar sobre o duelo maternidade x carreira que assusta a muitas. A ideia era
escrever um texto sério sobre o assunto, com números e fatos, mas se assim o fizesse, não
seria eu. Sou mulher, mãe e trabalhadora movida a questionamentos e emoções que nem
sempre consigo ou quero esconder. Então o que poderia dizer às mulheres que vivem
situações parecidas à minha? Só me vem à cabeça o óbvio, mas que não deixa de ser verdade:
não é fácil. Não é nada fácil.
Há 50 anos ou mais, as mulheres optavam (não sei se é a melhor palavra) ou era esperado
delas que cuidassem da família. Não era necessário carreira para isso, mas dedicação,
abdicação e carinho constantes, fios condutores para uma boa base familiar. A parte financeira
era de responsabilidade do homem. Por volta dos anos 70 e 80, com melhor instrução e uma
liberdade antes nunca vivenciada, as mulheres começaram a se arriscar em um mercado de
trabalho que antes era dominado por eles. E hoje elas querem mais, muito mais. Não vejo
problema em querer ou se identificar com um modelo ou outro, mas existem mulheres que
estão bem ali: no meio. Com família e com trabalho formal. E talvez o grande problema seja
que vivemos em uma sociedade que nos força a escolher. Não se pode ser feliz com a família e
o trabalho em igual medida. A proporção da atenção e dedicação nunca será a mesma. Ou
falhamos em casa ou no trabalho. O que gera uma culpa enorme e estressante em quem vive a
situação.
A profissional e mãe que aparecer à minha porta e disser que está totalmente satisfeita
profissionalmente, crescendo constantemente, feliz e com tempo de sobra para os filhos... Eu
vou trancar aqui dentro comigo para me ensinar ou mostrar como equilibrar objetivos
(maternidade e carreira) que parecem tão antagônicos. Talvez não o seriam, se fosse uma
decisão unicamente feminina e que não a afetasse não só financeiramente, mas em termos de
posição no mercado de trabalho. Claro que eu posso trabalhar e ser mãe ao mesmo tempo,
mas vou ganhar menos. Bem menos. Vai depender do quanto eu me dispuser a trabalhar. Não
é possível, hoje, abraçar as necessidades da família ao mesmo tempo e com a mesma
intensidade com que se abraça o trabalho. E sim, o trabalho dignifica o homem e tem a sua
importância. O que fazer então?
O que é certo ou errado, eu não sei. Mas sei como eu me sinto toda vez em que tenho que
abrir mão daquilo que julgo importante para mim no momento. O que acontece hoje é isso: se
preciso de licença médica para mim ou para ele, sou fraca. Se quero estar com meu filho em
seu aniversário, sou vista como menos dedicada que os demais. Se quero deixar de trabalhar
algumas horas para ter mais tempo com ele, sou vista como preguiçosa. Se quero estar
presente no dia das mães da escola, sou egoísta para com minha equipe. Infelizmente, colegas
de trabalho irão sempre julgar (consciente ou inconscientemente), assim como mães quando
você precisar colocar os interesses do trabalho à frente das necessidades dos filhos
momentaneamente. Por que ainda é tão difícil aceitar que mães não são menos mulheres ou
menos trabalhadoras que os outros?

Ao meu ver, o mercado de trabalho deveria começar a focar em resultados ao invés de
número de horas trabalhadas. Um trabalhador consegue ser produtivo por 8 horas
consecutivas? Quantas dessas horas não são desperdiçadas com aquele cafezinho prolongado
ou com aquele bate-papo no meio do corredor? Ou checando redes sociais durante o
expediente? Com uma política focada em resultados e não em quantidade de horas
trabalhadas, as mulheres teriam mais tempo para seus afazeres familiares sem se sentirem
culpadas. Não só isso, elas teriam a certeza de que estão utilizando as suas horas focadas de
trabalho da maneira mais otimizada possível e, portanto, ajudando a empresa. Como dizemos
em inglês, I rest my case.
Gostaria de finalizar demonstrando minha profunda admiração por mulheres e mães que,
assim como eu, carregam esse desafio de conciliar a vida profissional e familar diariamente. Se
a vida é um campo de batalha já somos vencedoras.